Francisco Gírio

Dinheiro Vivo: Artigo de Opinião
Francisco Gírio
Secretário-geral da APCV-Cervejeiros de Portugal

A proposta de Orçamento do Estado (OE/2023) é injusta e discriminatória para o setor cervejeiro, que procura sobreviver após dois anos com quebras de vendas históricas, de 30% a 70%, registadas durante o período de pandemia.

Este ano, com a inflação generalizada e a guerra na Ucrânia, têm ocorrido aumentos brutais no preço das matérias-primas (cevada, milho), energia, embalagens em geral, e vidro em particular. As dificuldades de tesouraria avolumam-se dentro do setor. Existem empresas artesanais a encerrar portas.

Neste contexto de fragilidade, o Governo propõe um aumento de 4% nos impostos especiais de consumo da cerveja (IEC/IABA) ignorando o consumo de vinho, que para este Governo não é uma bebida alcoólica, é tratado como se fosse um refresco. Daqueles sem açúcar. Mais vale assumir-se, como único e exclusivo, o consumo de vinho, apesar de este ser duas a três vezes mais alcoólico que a cerveja. É assim que o Ministério da Saúde cuida da saúde dos Portugueses.

“Este aumento apenas acompanha a inflação”? Não! Porque um simples aumento deste imposto agrava a carga fiscal face ao vinho que possui taxa zero de IEC/IABA. Ambos competem no mercado doméstico das bebidas alcoólicas, mas a cerveja paga IEC/IABA e um IVA de 23%, o vinho não paga IEC/IABA e paga apenas 13% de IVA.

Em Portugal, o IEC/IABA sobre a cerveja é de 21,10 €/hectolitro, enquanto em Espanha, é, desde 2005, apenas 9,96 €/hectolitro. Agravar este imposto quando Espanha o mantém congelado, é abrir as portas à concorrência espanhola.

As cervejeiras nacionais são duplamente penalizadas neste OE-2023: face às empresas nacionais do vinho, e face às cervejeiras espanholas e somos, provavelmente, a única indústria de fileira nacional com agravamento de impostos todos os anos.

Esta penalização trava a nossa competitividade, a criação de mais postos de trabalho, a geração de riqueza e o apoio a agricultores e à restauração e cafés. Estrangula as mais de 100 empresas artesanais de microprodução de cerveja que estão localizadas do litoral ao interior e ilhas, que ainda não amortizaram os seus investimentos. E mesmo as que os amortizaram, voltaram a reinvestir para aumento da sua capacidade de produção ou para investirem em redes mais alargadas de distribuição para se tornarem sustentáveis. Este empreendedorismo, fonte de desenvolvimento do nosso País, cria postos de trabalho e é já um património estratégico da nossa economia. No entanto, todas as artesanais irão pagar mais impostos ao Estado português do que qualquer grande empresa cervejeira espanhola, como a Mahou ou a Estrela da Galícia, pagarão ao Estado espanhol, em cada hectolitro de cerveja vendida. Basta!

O setor cervejeiro nacional reclama do Estado português um pacto de estabilidade fiscal de médio prazo e acesso a taxas mais baixas de imposto especial para os cervejeiros artesanais, até um dado limite de produção anual. É da mais elementar justiça para um setor que tem centenas de unidades de produção e gera emprego em Portugal.